Caro prefeito e ex-colega de Câmara Municipal Ricardo Nunes,

Caro secretário municipal da Casa Civil Ricardo Tripoli,

Caro líder do governo e vereador Fábio Riva:

 

Como é de conhecimento público, desde o dia 23 de junho, tenho sido criticado por alguns parlamentares, inclusive de outras casas legislativas e de outros estados, que têm repercutido e mobilizado suas redes sociais para que seja vetado o PL 197/2018, de minha autoria e de mais vinte vereadores, que institui a Lei Paul Singer – Marco Regulatório de Economia Solidária na cidade de São Paulo. Diante da continuidade dos questionamentos, por vezes desrespeitosos, venho complementar as informações que eu já havia lhes enviado sobre a polêmica, e sobre as quais falamos em agenda recente que tivemos, para melhor pontuar a atitude antidemocrática da qual tenho sido alvo.

O pedido de veto é sustentado por uma afirmação falsa de que o projeto supostamente permitiria o ensino da ideologia de gênero nas escolas municipais. Isso não é verdadeiro! O projeto aprovado institui novas formas de geração de renda, onde todas pessoas integrantes passam a ter direitos de efetiva participação em suas decisões. A política é coordenada pela Secretaria do Desenvolvimento, Trabalho e Empreendedorismo, e não trata do conteúdo curricular das escolas municipais, que, por sinal, é definido por legislações que não são apenas municipais, mas sim, sobretudo, federais. Em momento algum, a Lei prevê que o Prefeito Ricardo Nunes ou qualquer outro possa tomar a iniciativa de promover a ideologia de gênero nas escolas municipais.

A desinformação sobre o projeto começou a ser construída por meio de notícias  reproduzidas pelos perfis de alguns vereadores, como se houvesse um “jabuti” ou um “Cavalo de Tróia’, uma atitude maliciosa de minha parte de incluir, de última hora, um acréscimo ao texto que autorizaria a ideologia de gênero nas escolas. Depois de restabelecer a informação correta de que o texto final estava disponível a todos os parlamentares por sete dias, e também de mostrar que os pontos levantados agora estavam aprovados desde 2018, na CCG, e poucos dias depois, em primeira votação no plenário, a polêmica foi mudando, e se centrando somente na suposta ideologia de gênero nas escolas. A esta altura, o estrago já estava feito.

         A estratégia adotada pelos parlamentares que me atacam é justamente a de criar uma suposta rivalidade comigo e com minha iniciativa, que nada tem a ver com o ensino ministrado nas escolas municipais. Há uma contaminação intencional desse projeto específico pela polarização colocada no debate político nacional. Estão se aproveitando da dinâmica pouco construtiva das redes sociais para crescerem em uma rivalidade comigo que não existe e que não pretendo alimentar, mantendo a prática respeitosa com toda e qualquer pessoa, especialmente parlamentares. É preciso reconhecer esse movimento de oposição ao projeto nessa perspectiva, que na prática representa um desrespeito tanto à economia solidária quanto à minha história e à minha atuação  baseada na transparência e na ética na política.

Não posso permitir que os interesses obscuros, de incitar um debate nas redes sociais baseada na radicalização odiosa, se sobreponham a uma política pública de extrema importância para nossa cidade, especialmente nesse momento de crise que vivemos. Ficam horas falando de ideologia de gênero, de uma suposta proteção às crianças, sem que isso tenha a ver com a política que está sendo instituída.

 

 

Sempre construí em minha vida parlamentar uma atuação republicana, pautada no diálogo e no respeito a diferentes posições partidárias. Em mais de 40 anos de vida pública, nunca precisei deturpar ou criar falsos argumentos para promover ou questionar qualquer política e muito me entristece que eu esteja sendo alvo desses artifícios quando completo 80 anos de vida dedicados à construção da democracia no Brasil.

Reiteradamente, venho fundamentar de que não há qualquer autorização de ensino da ideologia de gênero nas escolas no projeto de lei Paul Singer. O argumento dos parlamentares é que o ensino da ideologia de gênero se autorizaria pela combinação dos artigos 3º, VIII – que traz o termo “identidade de gênero” – com o §2º do art. 10 da lei, que prevê que a economia solidária deve ser abordada na rede municipal de ensino.

O conceito de fake news é extremamente novo e muito amplo, uma vez que pode abarcar não só mentiras, mas também, informações passadas de forma parcial ou fora de contexto que induzem a compreensão em determinado sentido. Entre os tipos de fake news existentes, estão os boatos, que veiculam fatos falsos ou imprecisos como se legítimos fossem, e o conteúdo enviesado, que são histórias extremamente tendenciosas utilizadas no contexto político em favor de uma pessoa, partido, situação ou evento[1].

As informações sobre os dois artigos supostamente polêmicos são mobilizadas de forma parcial, descontextualizada do texto integral do projeto e dos objetivos da política instituída. E com isso, rivalizando com um político progressista, alguns parlamentares conseguem alimentar politicamente sua base de apoio, mobilizada a partir da suposta ideologia de gênero. Os políticos que defendem o combate à ideologia de gênero estão aproveitando para crescer politicamente em cima desse factoide.

A lei de economia solidária é voltada a estruturar um sistema que dê conta de institucionalizar meios de geração de renda, de forma coletivizada. Está na essência do projeto a ideia de cooperativismo, de uma atuação respeitosa entre os participantes, iguais entre si. Como não há hierarquia na organização interna, é essencial que haja o respeito a todos os que fazem parte da cooperativa. É justamente por isso que no artigo 3º se estabelece, entre os princípios da economia solidária, a “garantia de direitos e promoção dos direitos humanos nas relações, notadamente com equidade de direitos de gênero, geração, raça, etnia, orientação sexual e identidade de gênero“. 

Ressalto que o artigo fala do respeito aos direitos humanos nas relações das pessoas cooperadas e não no objeto da política. Esse princípio pretende evitar que haja situações de violência ou discriminação dentro das cooperativas. Ignorar o contexto e o real significado desse dispositivo para promover uma suposta oposição à ideologia de gênero nas escolas é atitude falaciosa e desonesta.

      Caros Prefeito Ricardo, Secretário Tripoli, e Líder Fábio Riva, não componho a base de apoio ao governo, como muitos desses parlamentares em conflito com o projeto aprovado, sendo inclusive o líder do maior partido de oposição. Entretanto, sempre tratei com o mais alto respeito os governos dos então prefeitos João Doria, Bruno Covas e agora do prefeito Ricardo Nunes, assim como a todos os parlamentares. Aliei-me às pautas do governo quando entendi que representavam os interesses da cidade, mas também, quando me opus a alguma medida, sempre o fiz de forma republicana e democrática aceitando resultados sem incitar discursos odiosos. É em nome desse respeito democrático que reforço meu pedido para que o projeto de lei 197/2018 seja integralmente sancionado, pois seu pedido de veto está eivado de interesses individuais e antidemocráticos. Serei testemunha da força de sua gestão no respeito ao mais alto nível de discussões entre o Poder Legislativo e o Poder Executivo, preocupados efetivamente com a cidade de São Paulo.

 

[1] Zannettou, S., Sirivianos, M., Blackburn, J., and Kourtellis, N. (2018). The Web of False Information: Rumors, Fake News, Hoaxes, Clickbait, and Various Other Shenanigans. Cornell University Library;

https://arxiv.org/abs/1804.03461https://arxiv.org/pdf/1804.03461.pdf