Jornal do Brasil.

Tive a honra de participar, nos dias 23 e 24 de novembro, em Cartum, Sudão, do Segundo Congresso de Especialistas e de Ministros das Áreas de Bem-Estar, Desenvolvimento Social de toda a África. Indicado pelo embaixador do Brasil naquele país, Antonio Carlos do Nascimento Pedro, em função da repercussão de palestras que realizei na África, fui convidado para falar sobre A experiência de combate à pobreza no Brasil, dos programas de transferência de renda como o Bolsa Família e a perspectiva da renda básica de cidadania. No primeiro dia, fiz uma palestra para 650 pessoas. No segundo, em reunião presidida pela ministra de Bem-Estar e Seguridade Social, Amira El-Fadil, do Sudão, falei para os ministros de Desenvolvimento Social africanos, cuja conferência foi encerrada pelo vice-presidente do Sudão, Ali Osman Taha.
Percebi um enorme interesse em todos os presentes em conhecer como o Brasil desenvolveu programas de garantia de renda para famílias com renda familiar per capita até R$ 140 por mês, relacionadas às oportunidades de educação e saúde, como o Bolsa Família. Além de outros programas como o de Benefício de Prestação Continuada ¿ para famílias carentes de idosos ou de deficientes ¿ os de Previdência Rural e Geral, do Programa de Erradicação de Trabalho Infantil, dentre outros. Expliquei como estes programas retiraram mais de 21 milhões de brasileiros da pobreza absoluta e permitiram que o Coeficiente Gini de Desigualdade Social caísse de 0,59, em 2002, para aproximadamente 0,53, em 2009. Também informei como o Congresso Nacional, por consenso de todos os partidos, aprovou a Lei 10.835, sancionada em 8 de janeiro de 2004, que institui, por etapas, a critério do Poder Executivo, iniciando- se pelos mais necessitados ¿ como faz o Bolsa Família ¿ a renda básica de cidadania, incondicional para toda a população brasileira.
Transmiti aos africanos, onde grande parte da população, inclusive no Sudão, segue o islamismo, que a proposição da Renda Básica de Cidadania é consistente com os fundamentos do Alcorão, como explicado pelos escritos dos quatro califas no Livro dos Hadis. Omar, o segundo califa, relata que toda pessoa que possua um grande patrimônio deve destinar uma parcela de sua riqueza aos que pouco ou nada têm, é o chamado Zakat. O seu pagamento é anual e obrigatório para todos os muçulmanos. De uma maneira geral incide sobre 2,5% da riqueza de cada pessoa. Fui convidado a visitar a Câmara do Zakat, onde dialoguei com os conselheiros que administram essas contribuições.
Comentei a intenção, anunciada pelo chefe do Gabinete Pessoal da Presidência, Gilberto Carvalho, do presidente Luiz Inácio Lula da Silva, de, após o término de seu mandato, se dedicar a uma maior aproximação com os países da África. Seu principal objetivo consiste nas formas de erradicação da pobreza absoluta. Essa, também, é a prioridade da presidenta eleita, Dilma Rousseff.
Em visita ao Palácio do Presidente do Sudão, fui convidado para um diálogo com Nafie Al-Nafie, principal assessor presidencial, equivalente ao chefe da Casa Civil brasileira. Explicou-me como o Sudão está procurando aprofundar o processo de pacificação de seus habitantes, depois da longa guerra civil que ceifou a vida de mais de 2 milhões de pessoas. Dentro desse processo, foram realizadas as eleições de março deste ano, e em janeiro próximo acontecerá um referendo ¿ estabelecido no Acordo de Paz de 2005 ¿ ocasião em que todos os eleitores do sul do Sudão, mesmo aqueles do sul que hoje moram na região norte, terão o direito de escolher se querem ou não constituir uma nação independente. Al-Nafie disse que o governo considera importante para o Sudão e para a África que o país se mantenha unido, mas que o resultado será respeitado. Pediu minha colaboração, inclusive junto aos congressistas norte-americanos, com vistas à normalização das relações com os EUA. Observou que muitas vezes esse país agiu de forma a estabelecer uma relação que enfraquecesse o Sudão no sentido de facilitar a exploração de suas riquezas. Considera, portanto, fundamental o aprofundamento das relações com o Brasil, com a América do Sul e com diversos países da Ásia, pois entende que tal fato possibilitará que as relações com os EUA se deem com maior soberania e respeito mútuo.
Um dos assessores do Palácio do Sudão me informou que o vice- presidente da República, Ali Osman Taha, ressaltou, em rede nacional, que as proposições por mim apresentadas deveriam ser seriamente consideradas.