O mandato do vereador Eduardo Suplicy acompanhou as 36 audiências públicas virtuais realizadas entre abril e maio deste ano para a discussão do Programa de Metas 2021-2024. Diante da inviabilidade de realizar audiências públicas presenciais, em razão da pandemia da covid-19 e do baixo índice de vacinação, a Prefeitura de São Paulo criou plataformas online para a discussão do Plano de Metas apresentado pelo prefeito Ricardo Nunes e realizou as audiências públicas de forma virtual.

 

Vista da favela de Paraisopolis, na zona sul de Sao Paulo, com predios de alto padrao do bairro do Morumbi ao fundo. (Foto: Apu Gomes)

 

A participação popular nas principais decisões que serão tomadas para os rumos da cidade, com a designação de metas e prazos a serem cumpridos, bem como obrigações da municipalidade, estão previstos no artigo 69-A da Lei Orgânica do Município. O parágrafo 2º da Lei ainda traz que o “Poder Executivo promoverá, dentro de trinta dias após o término do prazo, o debate público sobre o Programa de Metas mediante audiências públicas gerais, temáticas e regionais, inclusive nas Subprefeituras”.

A forma encontrada pelo Poder Público, no entanto, não foi capaz de garantir a participação de qualidade, democrática e universal, para todas e todos. As audiências públicas virtuais tiveram baixo comparecimento, problemas técnicos e metodologia confusa e engessada. É de extrema importância a realização de audiências públicas presenciais com o término da pandemia, com posterior revisão do Programa de Metas para incluir essas contribuições.

Em 14 de maio, depois que encerrou-se o ciclo de audiências públicas, entregamos um relatório à prefeitura, apontando os problemas que detectamos, com o objetivo de melhorar o diálogo da prefeitura com os munícipes, tanto no retorno das contribuições ao Programa de Metas, quanto no dia-a-dia, com transparência ativa e garantia de uma real participação social da população de São Paulo.

A íntegra do relatório enviado à prefeitura pode ser baixado aqui em formato pdf

 

Leia abaixo os principais trechos do relatório

Programa de Metas 2021-2024

Neste ano de 2021, a cidade de São Paulo está realizando a elaboração, debate e aprovação do Programa de Metas 2021 – 2024. Em abril e maio, ocorreram as audiências públicas virtuais, enquanto o Brasil tem vivido o auge da pandemia da Covid-19. Em 10/05/21, o Brasil ultrapassou os 15,2 milhões de casos, com mais de 423 mil óbitos. Só no Estado de São Paulo, contavam-se mais de 3 milhões de casos e já havia sido ultrapassada a barreira dos 100 mil mortos. No município de São Paulo, somavam-se  mais de 1 milhão de casos e mais de 31 mil óbitos.

Com esse cenário desesperador de mortes, a prefeitura divulgou que as audiências públicas do Programa de Metas (PdM) seriam apenas de forma virtual, pela plataforma Microsoft Teams, a  serem iniciadas no dia 10 de abril. Ainda que se admita a inviabilidade de realizar audiências públicas presenciais, é necessário assinalar que a participação social ficou extremamente comprometida. A Prefeitura não tomou medidas efetivas para lidar com esse contexto e preservar a participação popular.

Ainda em março, antes da entrega do PdM e do início das audiências públicas, as bancadas do PT e do PSOL pontuaram que o formato virtual prejudicaria a participação social neste instrumento tão importante. Foi apresentado o Projeto de Lei n° 201/2021, que dispõe sobre a realização de audiências públicas presenciais após a pandemia, com atualização do Programa de Metas conforme as contribuições trazidas. Também foram feitas representações no Tribunal de Contas do Município e no Ministério Público de São Paulo para garantir a participação social de forma presencial com o término da pandemia.

Ao longo do mês de abril, o mandato do vereador Eduardo Suplicy acompanhou as 36 audiências públicas virtuais – 1 geral, 3 temáticas e 32 Regionais -, ao longo de 21 dias. Embora possa parecer que o formato virtual pudesse ter capacidade de garantir maior alcance e participação, não foi o que se observou na prática. Pudemos analisar diversos pontos problemáticos, que serão expostos a seguir.

Prejuízos à participação social

O primeiro ponto a ser considerado são as condições concretas extremas que vivemos na pandemia. Os munícipes têm concentrado suas forças em não morrer, seja de COVID ou de fome. As pessoas têm passado por luto, duras perdas, familiares internados. Uma grande parcela da população não tinha como ter sua atenção voltada, naquele momento, para debater o Programa de Metas.

Um segundo ponto de grande destaque é a dificuldade e a desigualdade no acesso à internet. Uma parceria  entre a Fundação Seade, agência de estatísticas do governo estadual, e o Cetic.br (Centro Regional de Estudos para o Desenvolvimento da Sociedade da Informação), responsável pelo monitoramento de tecnologias de informação no país, traçou um retrato sobre o uso da internet no estado. O estudo apontou que 25% da população mais vulnerável nunca acessou a internet. Dentre os que acessam, a maioria é com uma internet de baixa velocidade (56%) e apenas pelo celular (67%). Em um momento de aumento da pobreza em nossa cidade, é bem possível que esses números estejam ainda mais acentuados.

Um terceiro ponto foi a escolha da plataforma Microsoft Teams. O governo argumentou que esta foi considerada a plataforma mais segura. Entretanto, muitos munícipes fizeram reclamações pela escolha, que trouxe entraves tanto de acesso, quanto operacionais, comprometendo a participação.

Esses três primeiros pontos levaram a uma baixa presença nas audiências públicas do PdM: em média, aproximadamente 60 pessoas acompanharam as audiências nas salas virtuais. Considerando que parte dos presentes representavam o Poder Público (em torno de 10 a 20 pessoas, entre secretários, subprefeitos, vereadores e equipe técnica), a participação de munícipes foi extremamente baixa. A audiência pública com maior participação foi a primeira a ser realizada, a  geral, que chegou a ter, no pico, 200 pessoas na sala virtual. As três audiências temáticas tiveram uma média aproximada de 90 pessoas. Nessas audiências, houve um número alto de inscrições e, por isso, diversos munícipes não puderam falar.

A maior preocupação foi em relação à presença nas regionais. Na Audiência Pública do Campo Limpo, por exemplo, somente 20 pessoas acompanharam na sala, com 7 falas de munícipes. Na do Ipiranga, foram 40 pessoas na sala, mas somente 15 inscrições com 10 ausências, ou seja, somente 5 munícipes falaram. Na do Aricanduva e Guaianases, apenas 7 e 5, respectivamente. As exceções foram Sé e Mooca, sendo essa última com 120 pessoas na sala.

Antes de se aventar a possibilidade de imputar esse cenário somente a um suposto desinteresse da população em discutir os problemas da cidade, é importante ressaltar a responsabilidade da Prefeitura na situação. A pandemia naturalmente tende a atuar como um fator desmobilizador, porém, a Prefeitura tampouco atuou para suprir essa desinformação e efetivamente estimular a participação popular.

Vistada Cohab Taipas, na subprefeitura de Pirituba-Jaraguá. Crédito: Humberto Muller/Agência Mural

Problemas técnicos

Além da baixa presença, ocorreram dificuldades técnicas, como na abertura do microfone (tanto por parte do técnico quanto do munícipe), atraso na transmissão, ou transmissão via Youtube sem som, como foi o caso da Lapa. Alguns munícipes ainda relataram que, quando havia transmissão da tela de algum participante, incluindo a apresentação do programa e o cronômetro para a fala de munícipes, o intérprete de libras não ficava visível, comprometendo o acompanhamento de pessoas com deficiência auditiva. Outra dificuldade técnica ocorreu na Audiência Pública Temática SP Mais Justa e Inclusiva, em que o link de acesso à sala do Microsoft Teams foi alterado, dificultando o acesso dos participantes.

Falta de regionalização e de orçamento

Um tema de grande importância que foi levantado em praticamente todas as Audiências Públicas foi a ausência de regionalização das metas e orçamento. O Poder Executivo informou que, na versão final, as metas serão apresentadas de forma regionalizada. Entretanto, era de fundamental importância que a regionalização ocorresse antes das audiências públicas para os munícipes trazerem as suas contribuições de forma mais qualificada.

Ausência de metas para enfrentamento da pandemia de covid-19

Outro ponto de destaque foi a ausência de metas específicas voltadas à covid-19. A pandemia ainda perdurará por um tempo, sendo necessárias medidas emergenciais por mais tempo. O que a prefeitura propôs foi a criação de um selo em metas relacionadas à covid, mas não houve metas específicas, tão necessárias neste contexto da pandemia.

Rio Pequeno, na zona oeste de São Paulo (Humberto Muller/Agência Mural)

 

Falta de diálogo da prefeitura com a população

No geral, os munícipes trouxeram diversas contribuições, críticas e, principalmente, perguntas. Entretanto, na maioria das audiências, os representantes da prefeitura não responderam as dúvidas. As audiências deveriam ter seguido um roteiro, composto por três etapas: a) apresentação da metodologia e leitura rápida das metas; b) escuta da população e de parlamentares e c) retorno aos questionamentos dos munícipes. No entanto, os representantes da prefeitura apenas faziam  a finalização do encontro nessa terceira etapa. Uma única exceção aconteceu na da Vila Mariana, em que o subprefeito respondeu dúvidas dos moradores. Na maioria dos casos, apenas informava-se que o retorno das contribuições ocorreria pela plataforma Participe Mais. Muitos munícipes pontuaram que o retorno apenas via plataforma não era suficiente.

Portais desatualizados

Em diversas audiências, um dos problemas apontados era a ausência de transparência e/ou atualização nos sites das subprefeituras. Em alguns casos, conselheiros participativos relataram dificuldade no diálogo com o subprefeito.

Contribuições virtuais pela plataforma Participe Mais

As contribuições virtuais também ocorreram por meio da plataforma Participe Mais, disponível no site Participe Mais

Entre 8 de abril e 10 de maio, os munícipes puderam enviar sugestões de novas propostas ou revisão das metas apresentadas na versão inicial do Programa de Metas. No total, a prefeitura recebeu 888 novas propostas e 1.513 contribuições às metas existentes.

Apesar do esforço da prefeitura em produzir um sítio eletrônico acessível a todas e todos, diversos munícipes relataram dificuldade por não possuírem familiaridade com as ferramentas  utilizadas  pela plataforma, o que reforça a necessidade de outras formas de participação social além da virtual.

A plataforma Participe Mais também será utilizada como ferramenta de retorno às contribuições dos munícipes que participaram das audiências públicas virtuais, que disseram não se sentirem contemplados apenas pelo retorno pela plataforma. Novamente, verifica-se que a ausência de respostas nas próprias audiências públicas virtuais e a inviabilidade de encontros presenciais contribuem para a falta de transparência ativa e de diálogo entre o Poder Executivo e os moradores e moradoras da cidade.


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Versão inicial do Programa de Metas 2021-2024 (formato pdf)

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